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Something in the way…

março 24, 2011 1 comentário

Nesses tempos em que tudo está mudando, nem as lembranças de nosso passado ficaram de fora. O conceito de patrimônio histórico foi ampliado há poucas semanas com o “tombamento” da  faixa pedestres localizada em frente ao estúdio londrino Abbey Road, eternizada na capa do álbum homônimo dos Beatles em 1969. É a primeira sinalização urbana a ganhar esse status em todo o mundo.

“Essa travessia não é um castelo ou uma catedral, mas graças aos Beatles e a uma seção matinal de fotos de 10 minutos, ela também tem o direito de ser vista como parte do nosso patrimônio”, afirmou  John Penrose, ministro do turismo no Reino Unido.

Na capa do LP, Paul, John, Ringo e George aparecem cruzando a rua sobre a faixa. O local não é exatamente o mesmo, a travessia foi movida por alguns metros devido ao trânsito, mas a fama permaneceu. Toda hora tem turista visitando o lugar e parando o tráfego de veículos só para imitar a célebre cena dos “reis do rock”.  Se você quiser conferir, veja imagens em tempo real no site www.abbeyroad.com/visit.

O conceito tradicional de “patrimônio histórico” refere-se a construções antigas, obras de arte de mestres célebres, enfim só coisas gloriosas ligadas a um passado que nem todos reconhecem como parte de sua vida. Nos anos 1970, a idéia foi expandida para abranger não apenas grandes monumentos, mas um conjunto de bens culturais mais próximos da identidade dos cidadãos comuns.

O “patrimônio cultural” engloba paisagens, lugares sem valor arquitetônico mas com grande valor afetivo para a comunidade (tipo o cine Belas Artes, em São Paulo),  tradições como a festa do Divino de Mogi, a aguardente Gentileza de Maria da Fé (Minas), artesanatos, saberes, o samba de roda do Recôncavo Baiano, e o ofício das paneleiras de Goiabeiras (Espírito Santo).

O tombamento da travessia de seis faixas brancas da Abbey Road vai além. Para São Paulo, a medida chega bem no meio da discussão da manutenção ou não do famoso relógio luminoso do Conjunto Nacional, na avenida Paulista, que completará meio século de existência em 2012. Desde 1976, seu letreiro carrega a marca do Banco Itaú, só que em 2007 a publicidade teve que ser apagada por causa da Lei Cidade Limpa. Recentemente, porém, o banco foi multado pela Prefeitura após a pintura de sua logomarca em azul e amarelo. Agora, a instituição apela para os órgãos do patrimônio e, se perder, vai deixar o condomínio do conjunto sem uma verba que ajuda muito sua manutenção.

Enquanto isto, no Rio, a discussão é outra. Por determinação do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), a Prefeitura deverá retirar de uma praça do bairro da Glória o busto de bronze do ex-presidente Getúlio Vargas. Nada contra ele, ao contrário, a iniciativa até o protege, pois a escultura é medonha, com três metros de altura, sobre uma base de dois metros e meio. O povo a apelidou de “Cabeção”.

Para Paul McCartney, autor da idéia da foto, o tombamento da travessia é “a cereja do bolo”, pois os estúdios Abbey Road, onde os Beatles gravaram a maior parte de sua obra, já possuem a mesma certificação histórica.  Ou seja, aquele pedaço no norte de Londres se eterniza como a “Meca para os fãs mundiais dos Beatles”.  E pensar que John Lennon, apressado, queria sair logo ali: “deveríamos estar gravando o disco e não posando para fotos idiotas”.

                                                                   Júlio Moreno

(Publicado em “O Diário de Mogi” de 23/03/2011)