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Avenida de idéias, praça de afetos

De campanha em campanha, os candidatos a cargos executivos incrementam  e diversificam as prioridades de seus planos de governo. Há 20, 30 anos, questões básicas como educação e  saúde somadas com obras viárias, asfalto e iluminação pública bastavam para influenciar o eleitorado. Depois vieram as preocupações com a criação de trabalho,  a construção de moradias populares e o meio ambiente. Hoje, mobilidade, sustentabilidade e segurança fazem parte dos discursos de todos.

Esses avanços ocorrem, em geral, muito mais por pressão da sociedade do que por idéias vanguardistas dos políticos. Menos mal, pois isso me deixa a vontade para questionar os candidatos a prefeito de Mogi das Cruzes se eles já ouviram falar da “economia criativa” e se ela faz parte de seus planos. 

O conceito é novo, há diferentes definições. Gosto da que ouvi da economista Lidia Goldenstein. Trata-se do conjunto de setores ligados à criatividade e às novas tecnologias que dão, por assim dizer, identidade à Sociedade do Conhecimento. São setores fundamentais para criar diferenciais e competividade para cidades, regiões e países.  

Os ingleses listaram 13 setores, tais como design, arquitetura, software, museus e mesmo esportes. No Brasil, há uma tendência a identificá-la simplesmente com ações culturais, como pensa o governo federal. É pouco. “É fundamental inserir a economia criativa dentro de uma visão de estratégia de desenvolvimento, não limitar à politica cultural. A “economia cultural” está dentro, mas a economia criativa é mais do que isto. Da mesma forma que ela é mais ampla que a “economia solidária”. É uma proposta de estratégia de desenvolvimento de setores lideres na geração de empregos, exportação e competividade”, diz a economista.

As grandes estruturas industriais, que diferenciavam as cidades e suas riquezas, hoje tendem a perder importância, na medida em que existe um  grande fluxo migratório da atividade industrial para locais onde a mão de obra é mais barata. São Paulo já vive isto. Mogi corre perigo.  “Os países e cidades tem que ter um plano de reação a essa tendência, que gera desemprego e situações perigosas do ponto de vista social. A economia criativa faz parte desse plano, o que não significa abandonar o setor manufatureiro. Ao contrário, sem economia criativa é que a industria perde força. Se não é possível mais competir no preço, é preciso criar diferenciais para os produtos como design, logística de entrega e marketing”.

Aplicada ao espaço urbano, a economia criativa gerou um novo conceito, o de “cidade criativa”, que outro economista, o português Carlos Martins, assim define: “uma cidade criativa é uma cidade que se faz de idéias e afetos”. 

E o que poderia ser feito em Mogi ? O incremento do turismo na cidade por conta da Festa do Divino, mas não apenas nos dias de sua realização, é um exemplo óbvio.  Tirar de vez do papel o Museu do Divino – único no País – seria um bom começo. Bilbao, na Espanha, compensou a desindustrialização com a construção de um ícone, o Museu Guggenheim, que lhe deu projeção urbanística e econômica mundial.

O apoio a setores com maior vocação para a criatividade agregaria novos valores ao PIB mogiano. A Prefeitura – em parceria com o Sebrae, as universidades e outras instituições – poderia criar “incubadoras” de empresas que lidam com produção audiovisual, Internet, animação, design, games, softwares e publicidade. O governo federal lançou um programa de apoio à indústria de software que prevê R$ 40 milhões para incentivo a “start-ups” e outros R$ 431 milhões a fundo perdido na criação de uma cadeia de fornecimento de softwares em torno das 15 áreas mais dinâmicas da economia. Embarquemos nele. O programa prevê a criação de 900 mil empregos em dez anos e dobrar para R$ 200 bilhões o faturamento de um setor composto 90% de micro e pequenas empresas. Muitas delas instaladas no Porto Digital do Recife que possui um centro de apoio ao empreendedorismo com escritório avançado em São Paulo para atrair talentos de fora. De quebra todo uma área histórica da cidade, a zona portuária, foi revitalizada.

Que tal, então, promovermos uma “feira de talentos” anual para os jovens brasileiros que apresentarem projetos criativos, úteis e com potencial de mercado ?  Os prêmios seriam incentivos para se estabelecerem em um polo de inovação e tecnologia a ser criado em Mogi.  

Uma Mogi criativa exigiria uma avenida por onde trafeguem suas idéias, ou seja, uma infraestrutura de banda larga para acesso fácil à Internet.

“Uma cidade, é claro, envolve muito mais do que as relações econômicas que nela se desenrolam”, lembra a administradora e doutora em urbanismo Ana Carla Fonseca. “ Unem-se a elas as relações sociais, a cultura local, os hábitos e atitudes da população, aquelas peculiaridades que fazem que um espaço seja tão diferente de outro e que dão alma a uma cidade”.   

Uma Mogi criativa promoveria nas escolas atividades para despertar o espírito inovador da garotada a partir de histórias reais contadas por gerações mais experientes. Cada uma seria uma espécie de praça de afetos.

(Publicado em “O Diário de Mogi”, de Mogi das Cruzes, em agosto de 2012)

                                                                                                                       Júlio Moreno