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“Amar a Deus e amar ao próximo….

… Esta é a Lei. Praticando a caridade”. Essa é a frase escrita numa parede do salão principal do Centro Espírita Antonio de Pádua, na rua Marechal Deodoro, em  lugar da existente no prédio antigo, na Senador Dantas:  “Fora da caridade não há salvação”. Mudam prédios e palavras, mas não o sentido: para o espírita não há fé sem obras sociais.

Na primeira sede, além da casa da creche e da maternidade, havia uma segunda onde foi instalada a primeira escola mista urbana de Mogi, no início dos anos 50. Entre as professoras, Clarita Coelho, Geraldina Porto e Adahyla de Campos Carneiro. A comida das crianças era preparada por dona Semiramis Araújo, zeladora do Centro, que residia numa casa dos fundos. No galpão do quintal funcionou ainda por bons anos um curso de corte e costura, conduzido por dona Diva Candelária (esposa do sr. Inocêncio, que compunha músicas).

A professora Adahyla foi casada por 62 anos com “seu” Álvaro Campos Carneiro, cuja vida se mistura ao Centro e vice-versa. Nascido em São Manoel em 1908, em 1945 mudou-se de Santos para Mogi. Iniciante no espiritismo quis o destino que, aqui, ele fosse cortar o cabelo justamente com o sr. Raphael Gracia Sierra, seguidor da mesma doutrina, que o levou para o CEAP. Em dezembro do mesmo ano tornou-se presidente da entidade, cargo que ocupou até o falecimento em 1999, em paralelo à carreira de contador e advogado.  Foi também vice-prefeito de Mogi.

Era uma pessoa elegante, serena, daquelas cujas palavras carregam junto a tranqüilidade. “A vida é um sonho”, ele dizia sempre, como relembra a psicóloga Magaly, umas de suas três filhas. Outra característica era o esfregar constante das mãos, palma com palma.

Sua firmeza de propósito foi decisiva para a construção, com recursos da comunidade,  dos novos prédios da maternidade, da creche e do CEAP. A pedra fundamental foi lançada em 1959.

A Maternidade da Mãe Pobre encerrou as atividades, mas as crianças da creche têm direito à assistência médica integral da Mogi Dor, que ocupou seu prédio. A creche Fraternidade continua ativa junto à sede do CEAP. Hoje dirigida por Ana Cristina Porto Marins, atende a 225 crianças, de recém nascidos a quatro anos. “Seu” Álvaro o local todos os dias.

Entre suas atividades doutrinarias, ele dirigia as tarefas de evangelização nas segundas e quartas (dia em que o salão lotava), nas sextas as sessões de cura espiritual e nas terças e tardes de sábado os grupos de estudo (cuja evolução natural resultou em trabalhos de psicografia). Nas manhãs de domingo, “seu” Álvaro cuidava da Mocidade Espírita, destinada à evangelização dos filhos dos freqüentadores do Centro. Ao final de cada encontro, após rezarem junto o Pai-Nosso, ele dizia às crianças: “agora voltem para casa e pratiquem boas ações, para na semana que vem me contar”. E na semana seguinte, ele perguntava: ‘quem vai falar hoje ?” e todos queriam ser o primeiro, lembra minha irmã Lucia Helena.

Ele trabalhou até as vésperas e sua morte, despachando documentos na Santa Casa. Foi sucedido por Theresinha Consolmagno, esposa do dr. Edson, espíritas atuantes; e Neusa Marins de Sousa, dedicada voluntária dos trabalhos samaritanos.  Hoje, dona Alzira Urbano cuida da entidade, cuja história centenária pode ser contada graças às anotações de dona Cacilda Almeida, a antiga bibliotecária.

                                                                                       Júlio Moreno

(Publicado em “O Diário de Mogi” de 22/06/11)

“Fora da caridade não há salvação”

O sucesso do filme que conta a vida de Chico Xavier é prova de que hoje o espiritismo é  compreendido e aceito por parcela respeitável da sociedade. Mas  há cem anos, num país predominantemente católico, uma doutrina ainda nova era objeto de preconceito. Mogi das Cruzes não fugia da regra.

No início do século passado, as reuniões dos adeptos tinham caráter restrito. Cada vez era na casa de um deles, Até que em 13 de junho de 1911 esse grupo pioneiro, em encontro  na casa do sr. Joaquim Benedicto Dias, criou o Centro Espírita Antonio de Pádua, agora centenário.

Consolidava-se ali um movimento iniciado anos antes por inspiração do imigrante português Antonio Gonçalves da Silva que, quando menino,  trabalhando como entregador de jornal em São Paulo, ganhou o apelido de “Batuira”, nome de uma ave de vôo ligeiro, tamanha sua eficiência no ofício. Adulto, empreendedor imobiliário, “Batuíra” acolhia em sua casa doentes pobres e escravos foragidos. Após a morte de um filho, abraçou a doutrina espírita. Fundou o Grupo Espírita Verdade e Luz, lançou um jornal com o mesmo nome e criou a Instituição Cristã Beneficente Verdade e Luz, para o  tratamento de enfermos tidos como incuráveis pela medicina terrena.

Mogi era uma das cidades que ele costumava visitar, por conta própria, para proferir palestras.  Aqui era acolhido na casa do Capitão Mariano de Souza e sua esposa Dona Elvira e fez bons amigos. “Desencarnou” em 1909, com 70 anos. Em 1910, faleceria o Capitão Mariano. O legado deles, porém, continuou firme com o surgimento dos primeiros médiuns. E nasceu a primeira instituição espírita da cidade.

A idéia da fundação do Centro teria vindo de uma mensagem psicografada de “Batuíra”, que  também sugeriu o nome do patrono. Uma homenagem ao frade franciscano que tinha o poder mediúnico de ser visto em dois lugares ao mesmo tempo.

O objetivo do CEAP era, e continua sendo, assistir material e moralmente, todos aqueles que necessitam de ajuda, sem qualquer distinção, conforme os ensinamentos cristãos de Allan Kardec.  Além de Joaquim Benedicto Dias, o grupo de fundadores tinha Francisco Wichan, Aleixo Custódio da Silva e Costa, Antenor de Oliveira Leite, Manoel Pinto Almeida, Guilherme Boucault, José de Sousa Franco, Manoel Luis dos Santos e Antonio Dias Pereira de Freitas.

Hoje situado na  rua Marechal Deodoro, o CEAP funcionou por várias décadas na Senador Dantas, 234. O prédio, que ainda existe,  tinha uma porta para a rua e um enorme salão onde aconteciam as sessões de evangelização. Na parede dos fundos estava escrito “Fora da caridade não há salvação”.  Aos fundos, um quintal com uma pequena casa e um galpão.

Uma marca forte do CEAP é a ajuda às mães carentes. Começou com a entrega dos “enxovaizinhos do bebê”, trabalho ao qual se dedicou por toda vida dona Delmira França Lopes. Nos anos 50, a sede foi ampliada com a compra de uma casa vizinha, adaptada para o funcionamento da Maternidade da Mãe Pobre, dirigida pelo dr.  Osmar Marinho Couto. Os médicos Célio Diniz Carneiro, Aristides Cunha Filho e Wilmes Gonçalves Teixeira eram os responsáveis pelo curso de parto sem dor e pelo pré-natal. O dr. Aziz Rizek era o pediatra. E a obstreta Carolina Ribas Tavares foi a primeira parteira, carinhosamente chamada de “dona Lula”.

Nessa época, já dirigia o CEAP “seu” Alvaro Campos Carneiro, de quem falarei na próxima semana.

                                                                                                  Júlio Moreno

(Publicado em “O Diário de Mogi” de 15/06/2011)